Descoberta
na Amazônia enzima para fabricar etanol de segunda geração
Com informações
da Agência Fapesp - 14/05/2018
Descoberta na Amazônia enzima-chave para obtenção do etanol de segunda
geração, ou etanol celulósico.[Imagem: Beta-Glucosidase Amazônica]
Etanol de celulose
A produção do etanol de segunda
geração, ou etanol celulósico, obtido a partir da palha e do bagaço da
cana-de-açúcar, pode aumentar em até 50% a produção brasileira de álcool.
Nosso país possui a melhor
biomassa do planeta, a capacidade industrial instalada, a engenharia
especializada e a levedura adequada.
Mas ainda falta completar a
composição do coquetel enzimático capaz de viabilizar o processo de
sacarificação, por meio do qual os açúcares complexos (polissacarídeos) são
despolimerizados e decompostos em açúcares simples. Compor uma plataforma
microbiana industrial para a produção do conjunto de enzimas necessárias é o
alvo de todas as pesquisas na área.
Um importante resultado acaba de
ser alcançado com a descoberta de microrganismos naturais capazes de produzir
uma enzima crítica para o êxito do empreendimento. A descoberta foi feita no
lago Poraquê, no município de Coari (Amazonas), próximo do Terminal Solimões da
Petrobras.
O estudo contou com a
participação de pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e
Materiais (CNPEM), da Petrobras, da Universidade de São Paulo (USP) e da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Enzima para fabricar etanol
Isolada, caracterizada e
produzida, a enzima mostrou-se compatível com duas fases essenciais da produção
do etanol de segunda geração: a fermentação e a sacarificação. A realização
simultânea dessas duas etapas oferece a perspectiva de uma grande redução de
custos para a indústria sucroalcooleira, uma vez que as reações podem ocorrer
em um único reator e com economia de reagentes.
"A sacarificação é a etapa
mais cara do processo. De 30% a 50% do custo do etanol celulósico é despendido
com as enzimas necessárias para transformar os açúcares complexos em açúcares
simples. E, atualmente, a eficiência da conversão realizada por essas enzimas
está entre 50% e 65%. Isso significa que de 50% a 35% do açúcar disponível na
biomassa é 'perdido' durante a sacarificação. O grande propósito do nosso
estudo foi encontrar biocatalisadores capazes de contribuir para o aumento da
eficiência", disse Mário Tyago Murakami, um dos coordenadores da pesquisa.
Segundo o pesquisador, no arsenal
de enzimas necessárias, atuando de maneira sinérgica, as beta-glucosidases têm
importância fundamental, porque respondem pela última fase da cascata de
sacarificação da celulose.
"Sabemos que, à medida que
aumenta o percentual do produto da sacarificação, a taxa do processo de
sacarificação cai porque a presença do produto inibe a atuação das enzimas.
Isso é uma espécie de regra geral. No caso específico, a glicose gerada
restringe a atuação das beta-glucosidases. Esse gargalo tecnológico tem sido
objeto de estudos exaustivos. Para aumentar a eficiência da sacarificação, é
preciso que as beta-glucosidases sejam altamente tolerantes à presença da
glicose", disse Murakami.
Devido a especificidades
genéticas, decorrentes de diferenças no processo evolutivo, enzimas homólogas
podem apresentar variados graus de resistência à inibição pelo produto.
Por isso os pesquisadores
partiram para um esforço de bioprospecção, procurando as beta-glucosidases mais
adaptadas à biomassa existente no território brasileiro. Para isso, foram
investigados os processos naturais que ocorrem em diferentes biomas do país,
tanto na Floresta Amazônica como no Cerrado.
Alimentação de celulose
O achado mais promissor ocorreu
no lago Poraquê, onde amostras da comunidade microbiana não cultivável local
apresentaram genes codificadores de beta-glucosidases com o potencial
industrial procurado.
"Em um habitat como o lago
Poraquê os microrganismos adaptaram-se a uma alimentação muito rica em
polissacarídeos, constituída por resíduos de madeira, folhas de plantas e etc.
A enzima beta-glucosidase presente nesses microrganismos é distinta de enzimas
homólogas resultantes de pressões evolutivas diferentes", disse Murakami.
O próximo passo será fazer
estudos de combinação dessa enzima com os coquetéis enzimáticos fúngicos já
existentes, visando o ganho de eficiência no aumento da sacarificação.
"Uma vez extraído o gene de
interesse, a partir de bibliotecas gênicas de microrganismos não cultiváveis e
de possíveis modificações racionais baseadas no conhecimento da estrutura para
aumento de termoestabilidade, ele é transferido para outros hospedeiros por
meio de técnicas de biologia molecular. O hospedeiro em questão é o trichoderma,
um fungo filamentoso que já possui um arsenal de enzimas ativas sobre
carboidratos. Com a adição da beta-glucosidase amazônica, ele terá seu
potencial aumentado. Trata-se de potencializar uma plataforma microbiana
industrial já existente", disse Murakami.
Bibliografia:
A novel β-glucosidase isolated from the microbial metagenome of Lake Poraquê (Amazon, Brazil)
Danyelle Toyama, Mariana Abrahão Bueno de Morais, Felipe Cardoso Ramos, Letícia Maria Zanphorlin, Celisa Caldana Costa Tonoli, Augusto Furio Balula, Fernando Pellonde Miranda, Vitor Medeiros Almeida, Sandro Roberto Marana, Roberto Ruller, Mario Tyago Murakami, Flavio Henrique-Silva
Biochimica et Biophysica Acta - Proteins and Proteomics
Vol.: 1866, Issue 4, April 2018, Pages 569-579
DOI: 10.1016/j.bbapap.2018.02.001
A novel β-glucosidase isolated from the microbial metagenome of Lake Poraquê (Amazon, Brazil)
Danyelle Toyama, Mariana Abrahão Bueno de Morais, Felipe Cardoso Ramos, Letícia Maria Zanphorlin, Celisa Caldana Costa Tonoli, Augusto Furio Balula, Fernando Pellonde Miranda, Vitor Medeiros Almeida, Sandro Roberto Marana, Roberto Ruller, Mario Tyago Murakami, Flavio Henrique-Silva
Biochimica et Biophysica Acta - Proteins and Proteomics
Vol.: 1866, Issue 4, April 2018, Pages 569-579
DOI: 10.1016/j.bbapap.2018.02.001
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